quinta-feira, setembro 27, 2007

Bazar

Felicidade não se compra. Vende-se.

sábado, setembro 22, 2007

Um retrato cretino da esperança

Quando ela saiu, fez questão de levar a chave e deixá-lo trancado em casa. Disse para esperá-la, que voltava, e que trazia pão fresquinho e carinho. Que esperasse. Depois, bateu na casa de cada vizinho e convenceu a todos que deveriam sair dali. Que era melhor, e que não se preocupassem, que ela chamava a empresa de demolição. Derrubou-se todo sinal de moradia num raio de quilômetros, até onde a vista dele alcançava. Dedetizou a região; mataram-se as pragas, e junto com elas simpáticas formigas, grilos, gatos e marias-sem-vergonha. Depois, calou o vento e os pássaros. Em seguida, mandou apagar o sol, e desintegrar a lua.

Voltou um tempo depois, e parou em frente à casa trancada. Sem ar que vibrasse as suas palavras, teve que passar um bilhete por baixo da porta. Avisava que demoraria mais um pouco, que era um imprevisto, que esperasse. Despedia-se com um beijo, cheio de promessas. Depois, fez queimar o bilhete, e a si mesma.

No bar às 21h

A Juliana disse que todo mundo está à procura da sua outra metade.

É mesmo? E o que você fez? Deu uma de homem sensível, né garanhão?

Não, fui bem sincero com ela. Que não existe essa história de metade faltando.

Ah, disse, foi?

Sim. Isso é balela. O que falta não chega a 40%.

Da série "Suspiros"

“Passas em exposição
Passas sem ver teu vigia
Catando a poesia
Que entornas no chão.”

Chico Buarque – As Vitrines


Efeita-se de mundos. Mentira ou ingenuidade, limitar seus adornos às gavetas da penteadeira, ao estojo de maquiagem. Até um sopro de vento e um vôo de pássaro enfeitam a mulher que intriga. Ela nasceu a mais filha das filhas da Terra. É tudo dela; se passa é o chão que a embeleza, e não menos o próprio ar que a perfuma.

A mulher que intriga, que enreda, que emaranha-se em nossos pensamentos. Todos nós sabemos dela como se sabe de uma memória antiga. Aquelas carimbadas dentro do estômago. Lembramos de tudo, mas não sabemos descrever um centímetro dela. Porque a mulher que intriga é assim mesmo: meio invisível pra quem olha, mas inevitável para quem sente. Inconfundível no seu próprio mistério.

Essas mulheres nem sabem de si mesmas. Nasceram; é tudo o que sabem. Não fazem idéia de que o mundo é seu. Quando se vêem no espelho, sorriem desconfiadas e incrédulas. Quando tentam lhes contar a sua ascendência divina, desentendem-se. Pensam em brincos e lábios. Nunca se apaixonam por si mesmas.

E há uma delas a cada esquina. Sempre uma surpresa, encontramos onde nunca esperamos. E ela logo passa. Está sempre caminhando, a mulher que intriga. Sempre passando, indo, a gente nunca sabe pra onde. Geralmente de cabelos soltos, pois estes guardam mais segredos.

O que a gente faz com elas? Não sabemos, não sabemos. Acho que não fazemos é nada. Nem sei se elas nos fazem bem ou mal. Até hoje o máximo que me aconteceu foi terem roubados minutos e minutos do meu dia a olhar pra elas.