quinta-feira, dezembro 28, 2006

Insetos e sucos de manga

Hoje, no café da manhã, interpelou-me da seguinte forma uma formiga metida a gente:

“Já ouvi de tudo nessa vida. Já me disseram que o amor é um dever, que o amor é a salvação, que o amor é uma mentira, que o amor é tudo o que eu preciso, que o amor é uma palavra de quatro letras, que o amor é o que me faz formiga. Você anda pensando que o amor é uma dúvida”.

Ela rondava o pote de achocolatado em pó, pequena que só. Eu tomava calmamente um suco de manga. Não lhe dei atenção. Mas também não lhe esmaguei com o dedo.

“Talvez amar seja ser compelido a escolher, não? Quem sabe o contrário do amor não seja o ódio, e sim a indiferença? Não há dúvidas sobre o que nos é indiferente, e é por isso que a paixão nos vira a cabeça, e abala o exoesqueleto. Porque com ela vêm a dúvida e a hesitação. O amor é não saber. Amar é duvidar que se ama. O que você acha?”

Permiti-me olhar para ela. Animal insolente. Quem era ela pra vir falar de humanidades para um humano? Desci o copo, com o intuito de partir o seu corpo com a borda do fundo de vidro. Ela escapou agilmente. Além do Português correto, ela era veloz como um atleta. Correu pra longe, e, antes de entrar na sua casa na tomada, olhou pra mim uma última vez. Acho que mostrou a língua.

quarta-feira, dezembro 27, 2006

Porque tinha que ser dito

Nas palavras de Rodrigo, O Chorão de Cachoeiras de Macacu:

Pra falar a verdade, acho que esse tal de Sócrates era mesmo um banana. Corruptor de menores, sim senhor, sofista e traidor do Estado ateniense. "Só sei que nada sei" uma ova. Tem coisas que a gente sabe. E não são poucas. Mas sabe mesmo! Que nem sabe o caminho pro banheiro de madrugada. Assim, de olho fechado e meio sonâmbulo. O problema é que os outros têm a péssima mania de saber também. E falar que sabem. E aí a gente descobre que eles sabem diferente. Dá briga. Soco, chute, essas coisas.

terça-feira, dezembro 26, 2006

Ao telefone

- Não sei... Mas é ser meio mala enxergar podridões em pleno Natal, né?
- Qual o quê! O Natal não é diferente de nenhum outro dia no ano. Fico puto com essa onda de bondade nas pessoas. Parece que todo mundo vai dar um daqueles abraços coletivos na Lagoa. E você é a Lagoa.
- É, você tem razão. Ser mala é falar “Qual o quê!”.
- Se não me engano, foi você quem ligou pra mim, e não o contrário.
- Sim, e pra desejar Feliz Natal, e não ficar ouvindo resmungo de velho ranzinza. Era só isso.
- ...
- Pra falar a verdade, eu nem gosto tanto de você assim. Mas tenho a péssima mania de ser educada e cordial.
- Já te mandaram tomar no rabo hoje?

Algumas ofensas depois...

- Olha, tenho que ir lá. Trocar 73% dos presentes que ganhei.
- Papai Noel está ficando gagá, né. Já era tempo.
- Cale a boca, que ainda estou ofendidíssimo com a senhorita.

Mais algumas ofensas depois...

- É um absurdo! Nunca confie numa pessoa que não gosta de bacalhau!
- Dá licença? Não gosto, e pronto.

Três ou quatro xingamentos depois...

- Amor, tenho que ir mesmo, tá?
- Tá bom, linda. Amanhã nos falamos.
- Durma com os anjos.
- Não posso.
- Hein?
- Você não está aqui.
- Bobo! Tchau, tá?
- Beijo.
- Beijo.

quinta-feira, dezembro 14, 2006

Absolutamente

Essa é uma resposta-brincadeira às minhas colegas Stephanie e Mariana. Como o personagem masculino nos diálogos delas têm cerca de 5% do cérebro funcionando, senti-me no dever de deixar a mocinha falar pouco e ouvir muito nesse aqui. Sabe, nada mais divertido do que provocar uma mulher! : )


- O problema é quando aparece alguém que dá aquele meio-sorriso de “já saquei tudo”, né.
- Como?
- É. A onipresente estupidez masculina lhes deixou muito mal-acostumadas. A sorte e a perdição das mulheres são os playboys que andam pela noite agarrando o braço das moças.
- Mas eu odeio quando fazem isso!
- Sim, mas eles lhes são necessários. Dão uma certa grandeza ao feminino, e é sempre bom estar por cima. Acho que foi uma facção excêntrica das feministas que um dia criou os pitboys e os excessivamente carentes e/ou tarados. O problema é que deve ter havido uma explosão no laboratório, e eles acabaram se multiplicando demais. Hoje estão em todo lugar.
- Hahaha, você sempre inventa historinhas para expressar alguma coisa. É meio que cretinice colocar nas mulheres a culpa pelos idiotas do mundo, não é?
- Talvez. Mas a cretinice maior é fazer isso através de uma historinha. Quando você vem e diz que isso é cretinice, eu viro com a minha cara de babaca e respondo que “é só uma historinha, pra querer dizer outra coisa”.
- E essa coisa seria...
- Na verdade, é só para jogar na mesa que as mulheres em geral têm uma necessidade de auto-afirmação maior do que a nossa.
- Será mesmo? Não somos nós que saímos por aí morrendo de medo de ter o pau pequeno...
- De fato. Mas quem é esperto não esconde que se preocupa com isso. Mas seria contraditório vocês admitirem que também precisam disso. Não na nossa frente. É que vocês necessitam da gente para se afirmar. Quer dizer, dos idiotas. De pau grande ou pequeno, a idiotice tem o mesmo tamanho.
- E aonde você quer chegar com isso, Mr.-I-know-women?
- Apontando e rindo desses é que vocês se orgulham de serem mulheres. Imagino que poucos prazeres sejam maiores do que odiar quando alguém agarra o seu braço na noite. Ou então dançar mais afastado “porque esse cara tá querendo alguma coisa”. O problema é que vocês não conseguem imaginar a possibilidade de ele estar só querendo dançar. Vocês nunca estão preparadas para os homens de que tanto sentem falta. E é por isso que perdem a cabeça quando conhecem um. O amor-próprio feminino consegue ir do céu ao chão em tempo recorde.
- Você está querendo transformar uma defesa natural feminina em um sinal de fraqueza.
- Não é fraqueza. É um sintoma. Depois de tantos séculos sendo menores do que os homens, consideradas menos inteligentes, interessantes e úteis, é apenas natural que busquem se engrandecer às custas dos desprezíveis entre nós.
- Eu estou sentindo cheiro de machismo?
- Absolutamente.
- Vai dizer que não?
- É por isso que amo esse advérbio. Não quer dizer que sim nem que não. Que nem as mulheres.
- Ah, então você também acredita que as mulheres são misteriosas?
- Na verdade, não. Só achei que seria uma frase de efeito. Aliás, eu posso nem acreditar em boa parte do que eu disse nessa conversa.
- Agora é você que está dando uma de misterioso!
- Absolutamente.