terça-feira, novembro 21, 2006

Coisas que surgem da insônia

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O que eu queria era fazer uma bela de uma homenagem ao amor e aos amantes, e à sua simplicidade devastadora. Queria era cuspir pra fora de mim a perda dessa mística do involuntário, do terrível odor do descontrole. Queria mesmo era exorcizar a minha individualidade autoritária. Queria amar por sorteio, por romantismo, química, magia, que seja. Deus! Queria amar até na biologia; que fossem amores darwinistas.

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Tu, estranha, que há pouco me conheceste. Falo com tu mesma. Quero que saibas que sou um impostor, um aborto do não-acaso. Não esbarrei em ti de propósito, nem ao menos surpreendi-me com teu sorriso deslumbrante. Eu já sabia. De tudo. Até do teu sobrenome impronunciável. Escolhi a dedo cada um dos teus defeitos inebriantes, derrotei meus rivais por pura crueldade, e não necessidade. Não lutei contra mim mesmo, não me debati na cama, noites sem dormir. Eu te calculei toda, mas nem por isso amo-te menos do que o bastante. Talvez eu a ame mais do que todos os amores de nosso mundo. Falta-me, quem sabe, apenas definir tudo isso. Tudo é canalhisse quando ainda não tem nome.

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Há ainda a possibilidade de tudo não passar de uma torpeza minha. Divirto-me com a hipótese de ser um escroque, de ter perdido meu coração numa ruela qualquer do Rio, em dia de temporal sem guarda-chuva. Divirto-me, mas é porque sempre fui o último a acreditar no pior. Talvez – pensamento horrendo – eu seja um idiota, um ser hediondo, que nem mereça a alcunha de “homem”. O que diriam se soubessem que todos os meus sentimentos foram, são e serão falsos, e que dissimulo a minha desumanidade com simpáticas reflexões pseudo-filosóficas? Mas não, não é tão assustador. Rio ao pensar nessas coisas. Divirto-me. Sou o último dos otimistas. Sou daqueles que só se acreditarão mortos quando os avisarem, com documento carimbado e firma reconhecida. “Fulano: falecido. Não cabe recurso. Cumpra-se”. Ou algo que o valha.


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Enquanto isso, sigo com a vida, amealhando pessoas queridas. Temo por elas; gostaria de me fazer entender. Poucas vezes fui tão sincero.

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quarta-feira, novembro 15, 2006

Nonsense com links (ao molho pardo, com várias opções de guarnição)

Obs: O texto é inútil e provavelmente de má qualidade. Incluo, então, para evitar violência, links aleatórios para aumentar a sua cultura geral.


O Crasso começou a ser tomado pelas reticências numa noite de cerveja. A princípio, pensou que fosse coisa do frio, um mau-olhado meteorológico nas cordas vocais. Parou no meio da cantada. E não era qualquer cantada; não perguntava se ela já tinha vindo ali, nem mesmo queria saber o nome dela, nome de princesa. Não, era uma daquelas criativas que surgem semana sim, semana não. No meio da frase, sorridente e confiante, “...”. Assim, reticência quadradona mesmo, fonte Verdana.

Não é preciso dizer que ele não pegou a mulher. E passou o resto da noite avexado; nem dançou Macho Man ou o medley dos anos 60. “Rouco. Rouco!”.

Rouco uma pindamonhangaba. Estava era, como descobriria mais tarde, reticente. (Não é esse o propósito das reticências? Revemos nossos dicionários, que a historinha é meio nonsense mesmo.)

Pois bem. Pegou alguns tic-tacs emprestado do Manuel. Deitou o dia seguinte inteiro. Pediu pra mãe fazer chá e paparicá-lo. “Menino, você não está muito velho pra isso não?”, ralhou a mãe, sempre mau-humorada. “Ah, mãe, você ...”. Não falou mais o resto do dia. Os pernilongos que erravam pelo quarto comentaram até que viram balõezinhos de histórias em quadrinhos, só com reticências. Essa foi pra deixar claro que silêncio é diferente de reticências. “Silêncio é silêncio, reticências são três pontinhos”, escreveu Al-Qali Mahdi, sábio sufista do século XVI.

Crasso... Que nome a mãe do moleque foi escolher! Era isso que sempre a sua namorada pensava, a Marcela. “Nome de cônsul romano!”, gabava-se do gosto duvidoso a mãe. “Cônsul? Com certeza devia ter havido um embaixador com um nome melhorzinho...”.

Sim, a Marcela era uma porta. Mas uma porta de madeira de lei, finamente decorada e envernizada, com figuras lascivas em alto-relevo, esculpidas por um holandês esquizofrênico viciado em prostitutas latinas. É, a Marcela vinha daquela longa tradição de mistura entre europeus e nativos, e era o que podemos chamar de gostosa de primeira linha. Deliciosa, para ser mais exato. E não precisava ser muito mais que isso.

Era a namorada do Crasso, e suas amigas – portas menos exuberantes: portinholas, portõezinhos, alçapões etc – sempre a tinham sacaneado por isso. Mas ele beijava bem, tinha um carro legal e era bem dotado. O que mais uma porta poderia querer? Olhos-mágicos e calços! Haha! Péssima piada, mas eu tenho certeza de que 60% dos que estão lendo isso pensaram nela antes de lê-la.

Mas agora ele estava reticente. Chato, hein? Ela queria falar de como achava que sua bunda estava caindo, e o máximo que recebeu de apoio foi um apertão na nádega esquerda. Nem uma palavrinha doce, ou mesmo safada. Também, com esse nome... Não sabia como tinha ficado com ele tanto tempo. “Dois meses! Que desespero, vou cair fora!”.

E caiu. O pobre do Crasso não pôde nem argumentar. Ficou tendo que ouvir o riso dos três pernilongos supracitados. Chamavam-se Xfv, Kll e Trw (pernilongos não conhecem vogais).

“(risos). Mnh hstr m qdrnhs fvrt! (risos)”. “(risos)”. Trw, não querendo, como Kll, dar como única contribuição à história uns risos entre parênteses, voou até a cama e picou o rapaz. Voltou todo cheio de si. Literalmente.

Histórias nonsense devem acabar abruptamente.